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Quilombolas vivem em situação de miséria em comunidades de Alagoas

Estado tem 69 comunidades formadas por descendentes de escravizados. Tabacaria, em Palmeira dos Índios, foi o 1º território quilombola reconhecido.


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  Fonte: Marcio Chagas e Paula Nunes/G1

Família Paulino dos Santos é uma das mais antigas na comunidade Tabacaria, em Palmeira dos Índios, município do Agreste alagoano

Família Paulino dos Santos é uma das mais antigas na comunidade Tabacaria, em Palmeira dos Índios, município do Agreste alagoano   Foto: Marcio Chagas/G1

Postado em: 20/11/2016 às 11:09:38

Berço da resistência negra no país, Alagoas mantém viva a memória de Zumbi dos Palmares, líder dos povos escravizados na luta pela liberdade. Mesmo com essa importante representatividade, muitos descendentes destes povos, conhecidos como quilombolas, ainda enfrentam racismo, miséria e vivem em comunidades isoladas com pouca ou nenhuma qualidade de vida.

O Brasil tem mais de três mil comunidades quilombolas em todo o país, segundo estimativa do governo federal, mas nem todas são reconhecidas. Em Alagoas são cerca de 69. Na data em que se celebra o Dia da Consciência Negra, 20 de novembro, o G1 mostra as dificuldades enfrentadas por famílias que vivem em uma dessas comunidades, a Tabacaria.

A comunidade fica na zona rural de Palmeira dos Índios, município da região Agreste, a 136 km de Maceió. Algumas casas são feitas de alvenaria, mas outras ainda são de taipa ou pau-a-pique, uma antiga técnica em que é utilizada argila e madeira para construção das moradias.

São cerca de 90 famílias quilombolas na comunidade que já foi refúgio de escravizados que fugiam em busca de liberdade. Uma das famílias mais antigas do lugar é a da dona Dominícia Paulino dos Santos, 62 anos. A matriarca da família é esposa de Gerson Paulino dos Santos, 71. Juntos, eles tiveram sete filhos e 20 netos.

“Ser negra e quilombola ainda é um sofrimento muito grande. Imagine você está na sua barraquinha, ajeitando um café para tomar, aí passa um ou outro em frente ao seu barraco, gritando: ‘levanta, dorme-sujo’. É uma humilhação! Quem dorme sujo é porco. Tudo isso nós já passamos aqui. Tudo isso nós já levamos aqui”, conta dona Dominícia.

"Ser negra e quilombola ainda é um sofrimento muito grande"

Dona Dominícia Paulino, 62 anos, remanescente quilombola

As ofensa racistas são constantes, mas ela ainda tem esperança que as coisas mudem e resiste em deixar o local onde viveram os seus antepassados.

“Ouvimos coisas horríveis. ‘Negro nojento, vocês vão levar uma camada de bala, rebanho de ladrão’. Eu já ouvi isso muitas vezes. Fazer o quê? Não podemos fazer nada, quem sabe um dia as pessoas pensem diferentes. Pode acontecer o que for, daqui eu só saio morta, quando Jesus me tirar”, relata.

Orgulhosa da sua raça e da sua história, dona Dominícia é toda bom humor, mas se entristece ao falar sobre as condições miseráveis em que a família vive.

“Não temos onde fazer nossas necessidades porque no meu barraco não tem banheiro, nem tem condições de ter. Quando precisamos, vamos ali na mata. Eu não tenho cerimônia de falar para as visitas, é triste, mas é a realidade da gente. Tomo banho na sala, pegamos a água no açude e, aqui mesmo na sala com o chão de barro, eu me banho. Sorte que não tem lama, porque nosso Agreste é muito quente.

O alimento também é escasso, e a maioria das famílias precisa plantar para comer. "Aqui nós plantamos feijão, e, graças a Deus, plantamos e colhemos. Este ano o milho não deu muito certo, o feijão nós tiramos um pouco mais porque plantamos mais cedo. Dura muito tempo. Chega um filho e diz que está precisando porque no mês não conseguiu tirar o dinheiro para comer, e eu dou. Feijão e farinha é a comida que nos deixa fortes”.

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