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Novo ataque nuclear pode acontecer a qualquer momento, diz sobrevivente da bomba de Hiroshima

Takashi Murita afirma que resultado das eleições americanas pode ser perigoso


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  Fonte: R7

Takashi Morita era policial militar e estava em Hiroshima no momento em que uma bomba nuclear destru

Takashi Morita era policial militar e estava em Hiroshima no momento em que uma bomba nuclear destru   Foto: Marcos Alves / Agência O Globo

Postado em: 22/08/2016 às 05:15:07

Agosto de 1945 foi um mês marcado pela angústia de quem lutava pela vida, após ataques nucleares destruírem as cidades japonesas de Hiroshima e Nagazaki. Setenta e um anos depois, a mesma angústia ainda toma conta da fala de Takashi Morita — policial militar japonês que estava em Hiroshima no momento em que a bomba atômica explodiu. No entanto, agora, essa angústia é o medo do futuro. 

— Tenho tantos medos: temo um novo ataque nuclear e o resultado das eleições presidenciais americanas... Temo Donald Trump.

Apesar de não querer estender o assunto, Morita disse ao R7 que enquanto o instinto de guerra fizer parte do ser humano, uma bomba atômica pode explodir a qualquer momento. E, para ele, políticas internacionais que favorecem a guerra só aumentam as chances de uma catástrofe, como a de agosto de 1945, ocorrer de novo.

Fã de Barack Obama, o ex-militar abre um sorriso de orelha a orelha quando relembra a visita do presidente americano à Hiroshima, em maio deste ano. Para ele, a polêmica causada pelo fato de Obama não ter pedido desculpas pelas bombas atômicas é irrelevante:

— Não importa se ele pediu ou não desculpas. Ele foi até lá, se importou. Conversou com sobreviventes, quis saber de nós. Um pedido de desculpas é algo pequeno perto do que ele fez.

Cidadão brasileiro há 66 anos, Morita visitou o Japão pelo menos uma vez por ano. No entanto, em 2016, o japonês não cumpriu a tradição, afinal, “seus 92 anos já não aguentam as condições da viagem” — são quase 22 horas de voo direto.

— Agora, quero alertar os brasileiros sobre os perigos de uma guerra. Palestrei muito no Japão, onde minha história ficou bem conhecida. Mas como não tenho mais condições de ir para lá, quero continuar minha missão aqui no Brasil.

No Japão ou no Brasil, Morita não economiza tempo para relatar a vivência de uma guerra nuclear. Com um sorriso aliviado, ele explica que não tem problemas em contar sua experiência:

— Estou vivo e pude salvar muitas vidas. Sinto que cumpri minha missão em Hiroshima. Foi muito triste, uma dor imensurável. Mas preciso ver o lado positivo disso tudo: estou aqui, e posso alertar a todos sobre os perigos da guerra. Meu conhecimento deve ser espalhado.

“Só vi um clarão”

Morita tinha 19 anos quando viu a cidade de Tóquio, onde atuava como policial militar, ser devastada por ataques a bomba durante a Segunda Guerra Mundial. Viu pessoas perderem suas casas e não terem como se alimentar. Foi quando o Exército japonês ordenou que ele fosse transferido, e pediu que escolhesse a cidade onde gostaria de atuar.

— “Hiroshima”, eu disse na hora. Eu nasci lá, queria cuidar do meu povo.

Quando chegou à cidade, Morita percebeu que ela não estava destruída como as demais cidades do país. Na hora, sentiu alívio.

— Foi bom ver que Hiroshima estava intacta: as pessoas estavam vivendo normalmente, havia comida e água. Mas mal sabia eu que os americanos estavam guardando-a para dar a cartada final.

No dia 6 de agosto, ele caminhava pela rua quando ouviu um barulho estrondoso, e um clarão tomou conta do céu da cidade. A um quilômetro de onde Morita estava, explodiu a bomba atômica. Pouco tempo depois, uma forte chuva de coloração preta caiu sobre a cidade, arrastando os milhares corpos já sem vida. As manchas esbranquiçadas que contrastam com a pele do ex-policial são uma lembrança física daquele momento tão marcante em sua vida.

— Corri para salvar crianças, muitas estavam machucadas, gritavam por socorro e pelas mães. Consegui atuar em Hiroshima por três dias, mas a radiação estava me afetando bastante. Me obrigaram a ir para o hospital.

Até os dias de hoje, Morita faz uso diário de remédios para tireoide, para evitar a manifestação dos efeitos da radiação que tomaram conta de seu corpo. O governo do Japão arca com os custos dos medicamentos.

Imigração

Cinco anos após o ataque, a família de Morita embarcou em um navio do Japão para o Brasil. Foram 40 dias de uma viagem que, segundo dele, tinha como destino o paraíso. O policial, a mulher e os dois filhos chegaram ao Brasil sem falar português, com a esperança de fugir da guerra — ou dos resquícios dela.

— Me disseram que o Brasil era incrível. Que não fazia calor, nem frio, e que não havia mosquitos.

E até hoje ele não se arrepende: acredita ter feito a melhor escolha, não apenas pelo clima mas pela recepção do povo brasileiro. Os olhos de Morita até brilham ao relembrar o momento em que chegou ao País:

— O povo brasileiro é muito receptivo, me senti em casa mesmo sem falar português. Trabalhei como relojeiro em uma galeria da Rua Augusta, onde consegui dinheiro o suficiente para sustentar minha família. Era pouco, mas conseguimos sobreviver.

Depois de um tempo, ele e a família decidiram abrir uma loja de comida japonesa na Av. Jabaquara, zona sul de São Paulo, onde trabalham em conjunto até hoje.

— Hoje, sou um legítimo paulistano. Sou feliz no Brasil e não me arrependo das escolhas que fiz. Espero que o mundo não se arrependa das decisões que vêm pela frente. Principalmente os Estados Unidos.

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