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A Arte e a Magia da Ilha do Ferro – a terra do passado, do presente e do futuro

O lugarejo de encantos e belezas é considerado o maior celeiro de artesãos da Região do Baixo São Francisco


Belezas e encantos da Iha do Ferro

Belezas e encantos da Iha do Ferro   Foto: Notícia Quente/Vânia Rezende

Postado em: 17/04/2017 às 06:00:00   /   por Redação

Por Helio Fialho

 

A Ilha do Ferro não é um arquipélago, contudo está repleta de ricos tesouros: seu povo, sua história e suas artes.  A origem do nome é inspirada na ilha chamada Belmonte, que fica bem em frente ao povoado. Este arquipélago quando visto de longe, principalmente para quem viaja da cidade de Pão de Açúcar em direção à Ilha do Ferro pelas águas do Velho Chico, o vê com aspecto e configuração semelhante a um antigo ferro de engomar.

E na confrontação da Belmonte que ocorreu o naufrágio do navio Moxotó, “O Titanic do Sertão”, no fim da tarde de 10 de janeiro de 1917, em consequência de enorme tempestade, matando dezoito pessoas. Os restos desta embarcação continuam até hoje no local para lembrar a grande tragédia.  

Apesar de muitos afirmarem que os primeiros habitantes da Ilha do Ferro são de origem holandesa, estudos realizados por alguns pesquisadores mostram que a terra onde nasceu o saudoso Fernando Rodrigues dos Santos foi fundada por espanhóis.

Os mais antigos moradores são pessoas com características europeias: pele branca, cabelos louros, olhos verdes (ou azuis), sotaque diferenciado dos demais moradores da região, o que pode ser chamada de voz melodiosa. Sandes (Sandez), Dias (Diaz), Lima (Limia), Alves (Álvares) e Torres (Torrez) são os sobrenomes que predominam no lugarejo, todos de origem portuguesa e espanhola.

Para confirmar a descendência espanhola dos primeiros moradores da Ilha do Ferro, a famosa artista plástica alagoana, pesquisadora e grande colecionadora de artes populares, Tânia de Maya Pedrosa, em uma de suas visitas à Espanha, viu um tipo de artesanato semelhante ao boa noite, um tipo de bordado exclusivo das bordadeiras desta comunidade ribeirinha, que fica a 18 quilômetros distante da sede Pão de Açúcar.   

É neste lugar, fincado no semiárido e banhado pelas águas cristalinas do Velho Chico, que mora um povo bonito, inteligente, hospitaleiro e dotado para a arte. Aliás, cada morador da Ilha é um artesão. Crianças, jovens e adultos de ambos os sexos encantam os olhos de quem os vê bordando, fazendo bancos, cadeiras, canoas, aves, bonecos de madeira e outras figuras exóticas.

 

Mestres de Canoas

A reportagem do Notícia Quente ouviu moradores idosos e ficou sabendo que os mais antigos ícones da arte de fazer canoas (de tolda, chata e de pescaria) foram os mestres Nivaldo, Juzinha e Álvaro, sendo muito conhecido este último como “Mestre Nenén”. E todos eram moradores da Ilha do Ferro. As embarcações fabricadas por estes falecidos artesãos superlotavam os portos das cidades ribeirinhas localizadas no Baixo São Francisco. Naquela época, era tão grande a quantidade de canoas, que mais pareciam borboletas com asas multicoloridas abertas viajando pelas águas do antigo Opará.  

 

Tamancos da Ilha

Estão entre os mais notáveis talentos na fabricação de tamancos macios e confortáveis, as artesãs Sinhara e Regina e os artesãos Juca, Ramiro e Eneias. Os antigos tamancos eram de madeira e couro preto forrado com flanela vermelha. Na época do “capote”, os bonitos tamancos da Ilha do Ferro eram os calçados mais usados durante a estação chuvosa.

 Com o passar dos anos, assim como as chuvas, os tamancos desapareceram e a nova geração  buscou outros tipos de artesanato para sobreviver. E o grande mestre dessa inovação foi o imortalizado artesão Fernando Rodrigues, conhecido como “O Mago da Natureza”. Ele, com sua criatividade extraordinária, utilizava galhos e troncos de árvores mortas, para fabricar bancos, cadeiras, bonecos e outras figuras exóticas, introduzindo, assim, uma nova fase de vida na comunidade.

E foi a partir dos idos de 1990, com ações realizadas pelo PRONAGER e SEBRAE, em parceria com os governos municipal, estadual e federal, além de outros entusiastas, dentre esses, o fotógrafo e pesquisador Celso Brandão e a colecionadora Tânia de Maya Pedrosa, que a Ilha do Ferro começou a aparecer no cenário das artes no Brasil e no exterior, sendo o bordado boa noite (confeccionado pelas artesãs da Cooperativa Art-Ilha) e os bancos de madeiras e os ex-votos (criados pelo artesão Fernando Rodrigues), os mais notáveis trabalhos, garantindo lugar de destaque em feiras e exposições realizadas em Maceió e em outras capitais brasileiras.

Com o passar dos anos foram surgindo novos talentos e hoje a Ilha transformou-se no maior celeiro de artistas de Alagoas, destacando-se os artesãos Valmir, Aberaldo, Dedé, Toinho, Vieira, Zé Alvacir, Evandro, Salvinho e tantos outros, além de dezenas de artesãs que fazem o extraordinário bordado boa noite.

A arte de “seu Fernando da Ilha do Ferro” influenciou, também, muitos artistas nascidos em outras localidades de Pão de Açúcar, destacando-se entre esses, o conhecido artesão Petrônio Farias, que foi amigo do mestre e tornou-se famoso  fabricando bancos, cadeiras, bonecos, ex-votos, pássaros e outras figuras exóticas, em seu ateliê instalado no Sítio Estrelo, à margem da estrada de acesso ao Povoado.

 

Os herdeiros de Fernando Rodrigues

Para quem visita a Ilha do Ferro, a casa do saudoso artesão Fernando Rodrigues é parada obrigatória. Lá, onde os herdeiros residem, podem ser vistas peças e fotografias do patriarca e visionário das artes. A casa continua com a mesma simplicidade dos tempos do mago. Nela, encontram-se o ateliê da família e diversas peças já prontas e outras sendo confeccionadas.

O ambiente é carregado de boa energia, além de oferecer uma visão panorâmica de rara beleza do Velho Chico que, apesar de fragilizado, passa serpenteando e banhando o lugarejo. E no ateliê ou “oficina”, como os donos da casa preferem chamar, os herdeiros do grande mestre e inspirador – a filha Rejânia, o genro Valmir, os netos Matias e Camille – estão sempre trabalhando e criando novas figuras, sendo auxiliados por outros membros da família, como Lucas, Thiago, Van e João Tortinho.

Rejânia, a única filha de Fernando Rodrigues, é uma das mais talentosas bordadeiras da Art-Ilha. É uma mestra consagrada do boa noite. Assim como o saudoso pai, ela trabalha com a alma, o que a faz produzir peças artesanais de excelente qualidade.   

 

A Ilha está bombando

A magia da arte desta comunidade ribeirinha vem atraindo novos moradores. São visitantes que se apaixonam pelo lugar e acabam comprando uma casa ou um pedaço de terra para construir uma moradia. Os novos proprietários são pessoas de classe média alta que moram em Maceió e em outras regiões do País. Tem até gringo de nacionalidade italiana no rol dos novos moradores da Ilha (que não é ilha) mais pitoresca da Região do Baixo São Francisco.

Em razão da fama que conquistou, a localidade continua sendo muito visitada por empresários, artistas, pesquisadores e gente famosa, que vêm, por água e por terra, de todos os lugares, conhecer este “paraíso das artes” muito divulgado em feiras, exposições, redes sociais, revistas e programas de televisão.

O arraial dos artesãos é mesmo um lugar diferenciado, onde a paz, a harmonia e o calor humano ainda não foram tangidos pela onda de violência que assola o País.  E os moradores que vislumbram o desenvolvimento turístico do lugar, também temem perder o sossego, a paz e o privilégio de dormirem com as portas e janelas de suas casas abertas, pois o progresso geralmente chega agredindo e descaracterizando as tradições e os costumes da comunidade.   

Por causa dos seus encantos a Ilha do Ferro está bombando e os preços de imóveis estão muito valorizados. E tendem a subir muito mais porque na comunidade a Universidade Estadual de Alagoas está construindo o Espaço de Memória Artesão Fernando Rodrigues dos Santos, que é um Museu de Arte Popular da UNEAL.

Foi idealizado pelo professor Jairo José Campos da Costa e é ligado ao Núcleo de Pesquisa em Literatura e Artes Visuais - NUPLAV, cadastrado no CNPQ. O espaço congrega diversos artefatos, tais como: esculturas em madeira, bancos, cadeiras, bonecas de pano e bordados, técnicas – boa noite, redendê, ponto cheio e labirinto e tem como finalidade realizar pesquisas no âmbito da arte popular alagoana bem como valorizar os artistas populares do Povoado Ilha do Ferro e entorno, no município de Pão de Açúcar, AL (escultores, rendeiras, confecção de bonecas de pano). A obra encontra-se em fase de conclusão e a inauguração está prevista para o primeiro semestre deste ano.

O Governo do Estado de Alagoas prometeu construir até 2017, através do projeto Viva Orla, a orla fluvial do lugarejo, com o objetivo de impulsionar o desenvolvimento turístico da região. Segundo informações, o projeto está em estudo e a qualquer momento as obras poderão ser iniciadas.

Para quem não sabe, a Ilha do Ferro já exportou pimentão orgânico para países da Europa, no início dos anos 2000, e continua fazendo muito sucesso com o bordado boa noite e o diversificado artesanato  em madeira que foi mostrado recentemente na novela “A Lei do Amor”, com as participações dos artesãos Aberaldo e José Alvacir no último capítulo da telenovela global.  

O acesso à localidade pode ser através do rio São Francisco. No porto de Pão de Açúcar estão ancoradas lanchas que podem ser alugadas. A viagem pelas águas do Velho Chico é panorâmica, relaxante e maravilhosa.

O percurso de 18 quilômetros pode ser feito, ainda, através da estrada vicinal de acesso à comunidade, sendo menos confortável por motivo do precário estado de conservação provocado pelas chuvas, o que necessita urgentemente da ação da Prefeitura Municipal de Pão de Açúcar, pois os moradores da comunidade e os turistas merecem estradas transitáveis.

Para se hospedar, o turista já pode contar com uma pousada recentemente construída por um casal de nativos. É a primeira pousada de outras que certamente virão com o desenvolvimento do lugarejo, que será no futuro próximo um dos destinos turísticos mais procurados do Baixo São Francisco. Visite e comprove. Click aqui e veja outras imagens na Galeria.

Comentários

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  • luis laercio 18 de Abril de 2017 Excelente reportagem; esse monte denominado de Belmont, é uma homenagem a terra de Pedro Álvares Cabral, lá em Portugal. Gostei também das informações sobre a embarcação Moxotó; no povoado Limoeiro, o Sr.Francisco, conhecido como "chico marceneiro", deu-me uma aula sobre o naufrágio do titanic do sertão. Parabéns ao Notíciaquente pelo show de informações.